quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Engolido pelas Palavras

Engolido pelas Palavras

Pingos de leite caindo suavemente sobre a tigela fria, já povoada de cereais de chocolate vindos das searas de trigo.

Ao ler aquela frase, pensei na tarde do dia anterior, quando a Susana tinha ido lá a casa. Acho que foi o lanche mais animado e delicioso da minha vida, até hoje.

A cor do leite ia passando de tonalidades puras para tons mais achocolatados, dando um ar mais apetecível à taça.

E o livro insistia na descrição! Era impressionante! Era como se estivesse a ver reflectida a realidade do dia anterior. Mas, mesmo assim, menos pormenorizada. A realidade é sempre mais real que qualquer descrição.

A colher mergulhou no leite, elevando-se segundos depois no ar com os cereais como passageiros de uma viagem de sabores.

O livro estava de tal forma escrito que parecia que estava a decorrer um momento de acção. Parecia entusiasmar a leitura como se de uma luta intensa se tratasse.

Após os cereais terem sido devorados por uma fissura gigante na espalmada cara de algum estranho ser assassino, a tigela ficou com menos quatro membros.

A história estava afinal vista através de que ponto de vista? Do dos cereais? Apesar de tudo, era como que se o autor estivesse estado presente no dia anterior a observar a cena do lanche entre mim e a Susana.

Menos quatro cereais.

Era uma coincidência muito oportunista, pois adorei lembrar-me dos acontecimentos já passados. Era bom rever o sabor do chocolate. Através das palavras.

Ser amaldiçoado esse que devora sem nunca pensar nas consequências para a presa. Que não admite que o tempo não é infinito para o mundo.

De repetente o modo de escrita mudara. Parecia agora mais sensibilizador. Parei de pensar no lanche e comecei a estranhar a mudança de escrita.

Se soubesse o quanto o detestamos. Se soubéssemos o porquê dos seus gostos
desperdiçadores!

Já não era melodioso, mas sim deprimente.

Morte aos inimigos da Natureza!!

Logo eu, que vivia a escrita de modo intenso, logo eu tinha de ler este livro! Porque é que o havia comprado?! Lera as primeiras três frases e achara tão musical…

Morte aos inimigos da Natureza!!

Era demasiada pressão. A culpa era minha, não devia entrar tanto dentro da leitura. A minha cabeça tombou para trás e bateu no chão, sentindo uma dor aguda atingir o meu crânio.

Morte aos inimigos…

Depois, uma luz. Depois um vazio. Depois, uma queda virtual. Mas real.

Morte.


Tiago

PS: Eu sei que também vocês devem ter lido isto de modo intenso. :)

3 comentários:

Aliice. disse...

Olha, está bastante excelente este texto sabias ? :]

Só o final é que começou a falar de morte outra vez, mas pronto.. xD

Adorei! :D

Tiago Mendes disse...

Obrigado :)

Filoxera disse...

É bom ler-te, Tiago. Continua!
Beijos.